É certo que, hoje, a melodia do Bolero, de Maurice Ravel, está entre as mais conhecidas da música erudita no mundo todo. Embora seja a única peça do compositor conhecida de muitos, sua obra é uma das mais belas e complexas da primeira metade do século XX.
Maurice Ravel é, junto a Claude Debussy, um dos maiores representantes do impressionismo musical na França. Dispunha de material folclórico de quase todo o mundo. Sua música conciliava as memórias da mãe de uma sociedade baseada em velhas tradições e valores com os sonhos de modernidade de seu pai. Tem meio pé na segunda metade do século XIX e, não há dúvidas, foi um dos mais competentes e influentes compositores do século XX, tendo sua obra conquistado, inclusive, a admiração do marrento e egocêntrico russo Igor Stravinsky (que chegou a dizer: "Ravel é o relojoeiro suíço da orquestração").
Ravel escreveu dois concertos para piano, na mesma época. Um deles é o Concerto para a Mão Esquerda, escrito entre 1929 e 1930. Escrito para o pianista austríaco Paul Wittgenstein, que havia perdido o braço direito na I Guerra Mundial, tem sua forma semelhante à dos concertos de Liszt: um único movimento, dividido em seções menores, interligadas. Esse concerto foi escrito enquanto o compositor preparava outro concerto para piano: o Concerto em Sol, estreado em 1932, pela pianista Marguerite Long (aquela mesma, do tão usado método de estudos para piano). Ravel não interrompeu a composição de nenhum deles por causa do outro. Ambos foram escritos após uma bem-sucedida turnê de Maurice pelos Estados Unidos. Lá, se impressionou pela harmonia e linguagem do jazz, diferente de tudo o que até então havia sido escrito na Europa. E com essa admiração pelo jazz escreveu seus dois concertos para piano, nos quais se pode notar muito de sua influência. "A mais cativante parte do jazz é seu rico e divertido ritmo...O jazz é uma riquíssima fonte de inspiração para compositores modernos, e estou assustado pelo fato de tão poucos compositores americanos serem por ele influenciados", declarou o próprio Ravel.
E é o Concerto em Sol que trago aqui, agora. Ao contrário do Concerto para a Mão Esquerda, este segue a estrutura tradicional, com três movimentos. A interpretação, aqui, é da bruxa Martha Argerich, tendo o ex-marido Charles Dutoit à frente da Orchestre National de France, em apresentação gravada em 1990.
O primeiro movimento - Allegramente - inicia-se com um estalo do chicote. O piano toca uma sequência em pianissimo, enquanto as flautas e um flautim apresentam seu alegre tema. Um clarinete anuncia uma série de glissandos (ato de deslizar sobre as notas) no piano, ascendentes e descendentes, por boa parte da extensão do teclado, e inicia-se, então, de fato, o concerto. A influência do jazz é percebida em todo o movimento.
O segundo movimento - Adagio assai - é dotado de uma beleza incomum. É aberto por um solo do piano, que tem a melodia principal em quase todo ele. Sua supremacia é brevemente interrompida por um diálogo com o corne inglês, logo após o clímax. Um trinado, decrescendo, ao fim, até que o som morra, lentamente, transfere o ouvinte para outro mundo.
Mais do jazz pode ser notado no terceiro movimento - Presto - no qual todo o virtuosismo do solista é explorado. Passagens de dificílima execução, em um andamento acelerado. Começa com quatro notas nos trompetes, (as mesmas quatro que o encerram - seguidas de um ataque súbito do tímpano). Um clarinete e um flautim tocam duas pequenas frases claramente norte-americanas, enquanto o pianista tenta se virar em sua harmonia. Nota-se, então, um quê do folclore francês na música de Ravel. A última parte é caracterizada por um ritmo bem marcado, nos temas do piano e da orquestra até que os metais anunciam o fim do concerto.
Download aqui (outra gravação, a meu ver ainda melhor, com la bruja Argerich e Claudio Abbado regendo a London Symphony)
3 de dezembro de 2009
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já estou dentro do blog,
ResponderExcluirpreparei pra postar a minha tão amada 4ª sinfonia de Brahms.
posto nesse fim de semana.
abraços mon ami.