Boa parte do que conhecemos hoje da obra do alemão Johann Sebastian Bach chegou até nós graças ao empenho que seu filho, Carl Philip Emanuel Bach, teve em conservar seus manuscritos. Mesmo assim, muito de sua obra se perdeu devido à falta de cuidados de outro de seus filhos, Wilhelm Friedemann Bach, que não tinha estabilidade financeira e, na necessidade, vendeu diversas partituras originais do pai, algumas delas até hoje nunca encontradas.
A obra de J. S. Bach não foi muito aclamada durante sua vida, e seu nome caiu no esquecimento do povo nos primeiros cem anos após a sua morte. Em meados do século XIX, outro compositor, Felix Mendelssohn, foi responsável por trazê-lo de volta à lembrança da Europa e, consequentemente, às salas de concerto. Era respeitadíssimo como organista, tido como um dos melhores e mais virtuosos que a Europa já havia visto. Entretanto, como compositor, era visto como anacrônico. Hoje, sabemos que esse julgamento de sua obra pelo povo alemão é completamente equivocado. O patriarca da família Bach introduziu, em suas peças, técnicas de composição que só passariam a ser exploradas quase um século depois, como o uso de dissonâncias, resolvidas em acordes consonantes (essas resoluções apenas passaram a ser abolidas em fins do século XIX), respeitando as regras da harmonia barroca. Além disso, Johann Sebastian desenvolveu o contraponto dos corais renascentistas, acrescentando-lhes um quê de rebuscamento.
Nascido em 1685, J. S. Bach deu seus primeiros passos como músico orientado pelo pai, Johann Ambrosius. Contudo, tornou-se órfão de pai e mãe muito cedo, aos dez anos de idade. Passou, então, a viver sob a tutela de um de seus irmãos mais velhos, o organista Johann Cristoph, que o ensinou técnicas de órgão e composição. Johann Sebastian copiava partituras do irmão durante a noite, para que pudesse estudá-las posteriormente. Porém, essas cópias foram queimadas por Johann Cristoph, assim que as descobriu.
Graças aos ensinamentos que adquiriu do irmão, J. S. Bach assumiu o posto de organista da igreja em Arnstadt.
Em 1705, mudou-se para Mühlhausen, onde casou-se com sua primeira esposa, a prima Maria Barbara. No ano de 1708, tornou-se organista da Corte e, seis anos depois, assumiu a direção da orquestra do duque Wilhelm Ernst, em Weimar. Em 1717, foi nomeado mestre-capela na corte do príncipe Leopold, de Anhalt-Köthen.
Durante uma das viagens do marido, esta veio a adoecer. Faleceu subitamente, deixando sete filhos. Casou-se, então, com a cantora Anna Magdalena Wülcken (a quem dedicou um caderno de estudos para iniciantes em órgão, o Livro de Anna Madalena Bach, hoje muito utilizado por recém-introduzidos ao piano). Em 1723, assumiu o cargo de diretor musical na igreja de São Tomás, em Leipzig, cargo este que ocupou até a sua morte, em 1750. Com Anna Magdalena, teve treze filhos.
Dos vinte filhos de Johann Sebastian, quatro tornaram-se grandes compositores. Dentre eles, destacam-se Johann Christian, grande compositor de sinfonias e lieds, e Carl Philip Emanuel, um dos responsáveis pela introdução da escrita classicista.
Nos últimos anos de sua vida, J. S. Bach foi, gradativamente, perdendo a visão, até a cegueira completa. Acredita-se que foi causada por diabetes, mas não há fontes suficientes que comprovem essa tese. Faleceu em 1750 após uma cirurgia mal sucedida nos olhos. Deixou de herança um vastíssimo repertório sacro - incluindo missas, cantatas e oratórios -, uma respeitável obra para órgão e cravo (Das Wohltemperirte Clavier, O Cravo bem Temperado, é cobrado por bancas examinadoras de provas nos quatro cantos do mundo), além de um repertório respeitável para outros instrumentos, do qual destacam-se as suítes para cello e as partitas para violino.
Trago aqui a gravação da pianista Martha Argerich da Partita nº2 para piano.
As partitas são suítes instrumentais, dos séculos XVI e XVII, compostas para apenas um músico solista. As partitas de Bach são, às vezes, chamadas Suítes Alemãs, em analogia às suas suítes inglesas e francesas. Bach compôs, ao todo, seis partitas para cravo (hoje, quase sempre executadas com piano). Suas partitas compõem seu último grupo de suítes para teclado, escritas depois das seis Suítes Inglesas e das seis Suítes Francesas. Dos três grupos, também é o que exige mais habilidade técnica do executante. Após finalizadas as seis, foram coletadas e publicadas em um volume único, em 1731 (antes disso, cada uma havia, também, sido publicada separadamente).
A Partita nº2 em dó menor, BWV 826, inicia-se com uma sinfonia. A sinfonia, no Barroco, é diferente da sinfonia tal qual concebida após o Classicismo, de Joseph Haydn, a grande peça orquestral de quatro ou cinco movimentos. A sinfonia barroca era uma introdução, um prelúdio, geralmente explorando a polifonia (embora apareça de forma modesta na sinfonia desta partita). Percebe-se a costumeira conclusão de um movimento em modo menor em um acorde maior, recurso estético amplamente utilizado na Renascença e no Barroco. Após a sinfonia, tem início um Adagio, movimento calmo, no qual Bach explorou apenas duas vozes no contraponto, servindo a mais grave mais como base para a voz principal que como melodia independente. A partir do meio do movimento, o caráter tranquilo dá lugar a um andamento movido, mas alegre. Tem início a polifonia: a voz grave passa a desempenhar um papel de maior destaque, torna-se principal, ao lado da aguda. Bach, nessa segunda parte do Adagio, constrói grandes e rápidos saltos de uma frase para a outra na voz grave, criando uma sensação de que há uma terceira voz. A maioria das edições concebe a sinfonia e o adagio como um único movimento
Após o Adagio, inicia-se uma Allemande. A allemande foi uma das danças instrumentais mais populares no Barroco, caracterizada por seu compasso binário simples. Nesta allemande, Bach constrói uma fuga a duas vozes, volta e meia usando seus característicos ornamentos (trinados e mordentes) no diálogo entre as vozes. Um ataque forte em dó menor anuncia o início da Courante, movimento agitado, com divisão ternária de compassos, contando com três vozes. Mantendo o mesmo compasso, segue a Sarabande, embora explorada com um andamento muito mais lento, no barroco. A melodia grave, nesta sarabande, é quase coadjuvante, marcando apenas os tempos e contratempos em boa parte dela. Em algumas passagens, também apresenta seu canto mais complexo, dialogando com a aguda.
Por fim, vêm as partes mais populares desta segunda partita: o Rodeau e o Capriccio. O rondeau é uma forma de composição, que apresenta um tema principal "A" e outro(s) temas, digressões, contrastando com este ("B", "C", "D", etc.), havendo a repetição uma ou mais vezes do tema principal. A forma mais comum do rondeau (aportuguesando, podemos chamá-los "rondó") barroco é A-B-A-C-A-B-A, podendo haver alterações. Nesta partita, temos um rondó no formato A-B-A-C-A-C-A, em andamento bastante movido, levando ao início do capriccio. O capriccio é o finale que Bach preparou para a peça. É um movimento forte, intenso, virtuosístico, desenvolvendo com agilidade três vozes musicais. Apresenta duas grandes seções, cada uma delas sendo repetida uma vez.
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8 de dezembro de 2009
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