Na virada do século XIX para os anos 1900, circulava no mundo musical uma lenda acerca de uma suposta "maldição da Nona Sinfonia". Desde Beethoven, alguns dos maiores sinfonistas europeus haviam falecido após a conclusão de suas nonas. Franz Schubert, Anton Bruckner, Louis Spohr, Antonin Dvorák, além do primeiro, o mestre de Bonn. Gustav Mahler inclusive chegou a, em uma tentativa de enganar o destino, compôr o ciclo Das Lied von der Erde (A Canção da Terra), uma coleção de canções de dimensão sinfônica após a sua majestosa Oitava, antes de escrever sua Nona Sinfonia. Segundo tal raciocínio, aquela que fora publicada como a nona corresponderia, na verdade, à décima. Não obstante, Mahler viria a falecer após sua publicação, deixando apenas o belo Adagio do que viria a ser sua décima sinfonia. O que poucos sabem é que Beethoven, assim como Mahler, chegou a deixar esboços para sua décima. É verdade que não foi tão longe como compositor austríaco. Ludwig van, ao contrário de Gustav, não chegou a concluir um movimento. Porém, os rascunhos deixados por Beethoven possibilitaram à sua posteridade ter uma ideia de como seria a sinfonia que sucederia aquela que se tornou a mais popular de todos os tempos.
No ano de 1844 (dezessete anos após a morte de Beethoven), Anton Shindler, secretário particular do compositor, levou a público a informação de que Ludwig haveria deixado escritos vários rascunhos para a sua décima sinfonia. Outro secretário seu, Karl Holz, declarara ter presenciado o mestre ao piano executando trechos do que seria o primeiro movimento. Cartas escritas por Beethoven continham claras alusões ao seu desejo de uma nova sinfonia, especialmente após o frenesi causado desde a première da Nona. A partir de então, musicólogos passaram a se interessar por essa provável derradeira composição.
O trabalho de pesquisa de diversos historiadores e musicólogos sobre manuscritos de Beethoven é constantemente prejudicado pela caligrafia - que beirava o indecifrável do compositor - somada ao fato de Ludwig ter deixado milhares de páginas, com poucas linhas, muitas vezes com frases incompletas. Por mais de um século, os manuscritos do que possivelmente seria a décima de Beethoven foram colecionados e estudados, à procura de uma compilação que trouxesse uma visão global sobre o que a sinfonia poderia ser. Em meados da década de 1980, foram apresentadas coleções de rascunhos de Beethoven datados da década de 1820, que mais tarde viriam a ser usados por Barry Cooper, musicólogo britânico especialista na obra do mestre de Bonn, na montagem de um possível movimento. Não há total segurança ou certeza sobre a destinação que o compositor daria a tais manuscritos, especialmente se se levar em consideração a pouca organização dos papéis de Beethoven. Não obstante, o trabalho de pesquisa feito foi o único que chegou a uma resposta sobre a enigmática Décima. Confiável ou não.
Barry Cooper apresentou sua compilação em 1988, tendo nela aplicado temas e motivos encontrados nos rascunhos obtidos. Por mais que páginas e páginas houvessem sido achadas por onde Beethoven escrevera, espaços em branco na montagem ainda se viram frequentes. Coube a Cooper, então, preencher tais espaços com motivos das próprias pautas exploradas. O resultado é um movimento, dividido em três seções (Andante - Allegro - Andante), que muito guarda do estilo de Beethoven. Não é Beethoven, no entanto, vale ressaltar. Porém, é válido recordar outras obras consagradas que foram deixadas incompletas por seus mestres: a missa de Réquiem de W. A. Mozart foi completada por Franz Xaver Süssmayer, aluno do gênio, após sua morte; a própria Décima de Mahler tem várias versões completadas ao longo do século XX, para não citar outros exemplos. Independente da legitimidade um tanto questionável da compilação de Cooper (e de diversas acusações sobre seu trabalho não resultar em música de inspiração comparável a outras obras-primas do compositor), Beethoven segue tendo completado apenas nove sinfonias, indiscutivelmente. Porém, já não se fala mais na "maldição da nona sinfonia". Dimitri Shostakovich cuidou de derrubá-la.
A mais famosa gravação da montagem de Barry Cooper ficou a cargo do maestro Wyn Morris, com a Sinfônica de Londres, em 1993:
Download aqui.
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