A música da Europa Ocidental não encontrou grandes obstáculos para chegar ao dia-a-dia das pessoas em nosso tempo, em qualquer parte do mundo. Contudo, a de outros países europeus menos expressivos política e economicamente, as chamadas "pequenas nações", fica, muitas vezes, restrita às suas próprias fronteiras. Há, obviamente, compositores que alcançaram reconhecimento internacional. É o caso, por exemplo, do norueguês Edward Grieg, do dinamarquês Carl Nielsen, do polaco Karol Szymanowski, do tcheco Leoš Janáček ou do finlandês Jean Sibelius. Todos estes têm em comum um forte sentimento patriótico, uma intensa presença da cultura de sua terra natal em sua música.
O início do século XX foi um período difícil para jovens compositores que insistiam em manter-se unidos ao sistema tonal e às estrutras românticas, em meio a tantas inovações que vinham sendo feitas na música erudita de então. Estes eram constantemente julgados pela crítica como anacrônicos, escravos de uma linguagem musical tida como obsoleta.
Jean Sibelius foi o mais popular compositor que a Finlândia produziu. Nascido em 1865, Sibelius é reconhecido por uma respeitável coleção de poemas sinfônicos escritos, em sua maioria, nos anos 1890, além de suas sete sinfonias, concluídas a partir da virada do século. A Segunda, especialmente, foi adotada pelo povo finlandês como um tema de sua luta pela independência. Repleta de motivos nacionalistas, era considerada como uma afronta ao czar russo, que teve domínio sobre a região até 1917. Enquanto ia conquistando a admiração do público conterrâneo e ganhando projeção internacional (embora rejeitado pelos defensores das inovações da Segunda Escola de Viena), Sibelius via-se cercado de dívidas, e atingido por muitas doenças (como estudiosos afirmam que o compositor era hipocondríaco, não é possível falar delas com exatidão). Também começava a apresentar problemas relacionados ao alcoolismo. Em 1904, deixou a cidade para viver com sua família em Ainola, uma solitária e rústica propriedade nas proximidades de Helsinki, cercada pela densa e silenciosa floresta nórdica.
Jean Sibelius viajava com frequência à Europa Ocidental, para que pudesse acompanhar a evolução da música europeia. Lá, assistiu a peças de R. Strauss, Schoenberg, Debussy. Acredita-se que parte do caráter sombrio de sua Quarta sinfonia de deva à influência que tiveram esses contatos com a música moderna. Também é explicado pela fase que o compositor vivia, temporariamente afastado do álcool devido a intervenções cirúrgicas para a retirada de um tumor na garganta.
A partir da quinta sinfonia, Sibelius entrou em uma fase de decadência criativa. Compôs mais duas sinfonias, muito bem aceitas pelo público, mas tornava-se cada vez mais rara a publicação de uma obra notável. Voltou a beber, e entregava-se cada vez mais à solidão de Ainola. Por anos trabalhou nos manuscritos de uma Oitava sinfonia, que prometia ser sua obra-prima, pressionado por grandes empresários da música. Porém, a sinfonia, que começou a ser escrita em 1923, nunca foi concluída.
Sibelius morreu em 1957, aos noventa e um anos de idade, vítima de uma hemorragia cerebral.
Das sinfonias, uma de minhas preferidas é a Segunda, a mesma que os finlandeses adotaram como símbolo da independência, e executavam em reuniões secretas contra o poder czarista. Ao contrário da maioria das sinfonias até então, cada movimento apresenta passagens de caráter diferente. Inicia-se com um tema alegre, de uma calma quase pastoril. A impressão que se tem é que a música contém um pouco da esperança do povo finlandês em libertar-se. Todavia, Sibelius sempre afirmou que a Segunda sinfonia nada tinha a ver com a luta pela libertação da Finlândia. O segundo movimento tem um caráter melancólico, próximo do trágico. É interessante, nesse segundo movimento, perceber a divisão clara das vozes das cordas, e a forte presença dos instrumentos graves da orquestra. Os dois últimos movimentos são "costurados" em um só. O terceiro inicia-se como um scherzo, um movimento agitado, em que se destacam as cordas. Porém, no mesmo terceiro movimento, há uma forte presença de passagens tranquilas, nas vozes das madeiras, que se concluem em reapresentações do tema inicial. Um crescendo em uma última passagem das cordas liga ao início do quarto movimento, com um tema triunfante das mesmas, seguidas pelos metais. Dentro do último movimento, madeiras e cordas dialogam entre si em passagens de maior tensão, e há a reexposição e variações do primeiro tema das cordas em diversos registros da orquestra. A coda final, marcada por um diálogo entre tímpano e metais, conclui com pompa a mais popular sinfonia do mais popular artista finlandês.
A gravação é da Sinfônica de Boston, regida por Sir Colin Davis.
Agora, um presente aos leitores: a fantástica gravação ao vivo do terceiro e quarto movimentos da sinfonia, realizada em 2009, com a OSESP, regida por Frank Shipway:
Download aqui
31 de janeiro de 2010
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